"Toda história tem três lados: o meu, o seu e os fatos." ( Foster Russel)

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

POEMA OBSCENO, Ferreira Gullar


Façam a festa
cantem e dancem
que eu faço o poema duro
o poema-murro
sujo
como a miséria brasileira

Não se detenham:
façam a festa
Bethânia Martinho
Clementina
Estação Primeira de Mangueira Salgueiro
gente de Vila Isabel e Madureira
todos
façam
a nossa festa
enquanto eu soco este pilão
este surdo
poema
que não toca no rádio
que o povo não cantará
(mas que nasce dele)
Não se prestará a análises estruturalistas
Não entrará nas antologias oficiais
Obsceno
como o salário de um trabalhador aposentado
o poema
terá o destino dos que habitam o lado escuro do país
- e espreitam.

FERREIRA GULLAR

Nascido em 1930, no Maranhão, Ferreira Gullar é o pseudônimo de José Ribamar Ferreira. Além de poeta, é crítico de arte, biógrafo, tradutor, argumentista de teatro e televisão, memorialista e ensaísta brasileiro.
Vencedor por duas vezes do Prêmio Jabuti (1999 e 2007), Gullar foi ainda indicado ao Nobel em 2002.

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